Há
algumas semanas que eu, Kang Se Ra me tornei mais próxima do Daniel Pitt, a
quem chamo carinhosamente de “oppa”. Ele está fora, e eu aproveito para entrar
sorrateiramente em seu apartamento, em seu quarto. Impressiono-me ao ver que ele guarda uma foto
de quando era criança... A mesma foto da minha infância, a única que tenho
dessa época. Aproximo-me mais do porta retrato e o aperto contra o peito,
devido ao sentimentos que aquela fotografia me trouxe.
Começo
a vasculhar mais o quarto de meu oppa, até que encontro em uma das gavetas de
sua cômoda, um envelope. Abro-o cuidadosamente e vejo que dentro há uma pequena
carta, em um papel amarelado. A letra caprichada como sempre, mas percebi que
agora havia algo diferente nos traços... Será que ele hesitava enquanto
escrevia?
Comecei
a ler:
Querida Mi Young,
Não sei se essa carta
chegará algum dia até as suas mãos, tampouco se o meu desejo incessante de te
encontrar se tornará realidade. Mas, ainda me resta alguma esperança, então lhe
escrevo para lhe revelar meus verdadeiros sentimentos, que guardei comigo há
décadas:
Há exatamente 20 anos
que estou à sua procura. Você sempre foi uma irmãzinha muito alegre,
espontânea, que espalhava a alegria por onde passasse. Dava gosto de vê-la
sorrir, ainda que fosse por coisas simples, como o raiar de um dia, por
exemplo. Você sempre foi muito decidida, sabia o que queria mesmo antes de
alguém te perguntar qual profissão gostaria de seguir no futuro. Eu demorei
anos a escolher o que realmente gostaria de ser, algo que você decidiu em
questão de dias. Bom, mas o que eu quero te dizer é que sempre foi você.
Independente do que acontecesse, era você que me dava energia, que me dava
confiança.
Como seu irmão mais
velho, sempre pensei que eu que precisava te ensinar (e provavelmente assim
pensavam nossos pais, naquela época), mas eu sempre acabava aprendendo mais com
você do que você comigo. Por isso posso me considerar um homem e um irmão de
sorte por ter tido uma garota tão sábia como você ao meu lado. A cada dia que
passava queria ver o teu sorriso brilhar mais e mais. Então, quando você me
pediu alegre e delicadamente: “Oppa, eu quero um sorvete!”, eu não consegui te
recusar. Estava calor, nós merecíamos algo gelado para compensar naquele dia.
Não, você merecia. Eu queria te fazer feliz, queria te fazer sorrir uma vez
mais, por isso pedi que esperasse sentada em um banco, enquanto buscava o
sorvete. Mas foi um descuido meu, uma falha minha, ter me separado de você. Te
perdi em questão de minutos, algo que nunca imaginei que poderia acontecer. Mas
naquele dia aconteceu exatamente isso. Se me arrependo? Muito, muito mesmo.
Hoje amadureci desde aquele incidente e sei que “um erro leva a um
arrependimento”. Se pudesse fazer o tempo voltar, eu com certeza faria tudo da
forma certa desta vez.
Mas, se há uma coisa
que eu aprendi com a vida foi que ela continua, e que nós precisamos seguir
nossas vidas. Entretanto, a consciência ainda pesa e o desejo de ter ao meu
lado aumenta a cada dia, a cada hora.
Agora, passados tantos
anos, e depois de nos separamos por culpa minha (as pessoas dizem: “não se
culpe”, mas é inevitável, querida), pode parecer egoísmo da minha parte querer
te ter aqui comigo, mas acredite, esse é o meu maior desejo, por isso te
procurei por tanto tempo, porque você é muito importante para mim. Você é a
minha companheira, e a minha família.
Por isso, se um dia nos
encontrarmos novamente, espero que me perdoe por tudo que fiz. Pelos meus
acerto e erros, porque independente de toda e qualquer outra coisa ou pessoa
que exista, eu sou seu irmão. E sempre serei.
Por fim, só quero que
tenha uma única coisa instalada em sua mente: esteja onde estiver, olhe sempre
para o amanhã, que te espera todos os dias, trilhe seu caminho, realize seus
sonhos e principalmente... seja muito, muito feliz.
Com
todo amor,
Seu
oppa
PS: Se esta carta
chegar às suas mãos, saiba que essas palavras são as mais sinceras que
encontrei, porque são de coração.
Minhas
mãos ainda estavam trêmulas no momento em que havia acabado de ler a carta.
Percebi, naquele mesmo instante, que eu tinha lágrimas nos olhos, que não
paravam de rolar. Tentei reprimi-las diversas vezes, mas não foi possível.
Sempre fui forte (ou pelo menos queria me mostrar/parecer assim), mas depois de
ler algo tão singelo quanto comovente, nem eu mesma fui capaz de controlar
minhas próprias emoções, que se afloravam naquele momento, naquele pequeno
quarto que me trouxe de volta a infância.
— Oppa... — suspirei ao falar, e
deixei uma última lágrima escorrer.
Já
mais calma, sequei minhas lágrimas e devolvi o papel (no envelope) para o lugar
onde estava. Minutos depois, alguém bate
à porta, e já tenho a impressão de que sei quem é a pessoa que bateu: Ninguém
menos que o “dono” do quarto: Daniel Pitt, designer mundialmente conhecido, e
meu irmão mais velho. Aquele me fez chorar com suas palavras ternas um pouco
antes, que me deu conselhos semanas atrás, mesmo antes de descobrir nossa verdadeira
relação, os laços de família que carregávamos há tempos.
A
porta se abre de leve, e alguém dá passos largos e igualmente leves para
adentrar o local. Instantes depois eu vejo que estava certa. Era mesmo ele, que
havia voltado dos compromissos e agora estava bem ali, na minha frente. Como eu
iria encará-lo? O que diria a ele? Não podia esconder-lhe a verdade, mas também
não sabia como reagiria se eu falasse isso do nada. Ainda assim, decidi
arriscar falar a ele quem sou.
— Oppa... — agora eu falava com
mais força, mas ainda estava hesitante.
— Kang Sera? — ele pronunciou o meu
nome com ar de dúvida, obviamente sem saber como vim parar ali, ainda que
fôssemos vizinhos.
— Mi Young — eu disse, decidida a
contar-lhe tudo.
— Como? — ele estava surpreso e
meio sem entender
— Temos que conversar — eu lhe informei e ele
concordou, assentindo.
Sentamos
na cama dele e começamos a conversar.
— Sobre o que quer falar?
— ele quis saber
— Sobre alguém que você
quer encontrar. É um assunto bastante delicado — eu declarei, sinceramente. Acho que ele
entendeu do que se tratava na mesma hora, porque engoliu em seco, e só
respondeu:
— Imagino
— Esta foto aqui do lado
— eu apontei para o
objeto — Você a tem desde
quando?
— Tenho desde sempre, é
uma memória boa da infância. Mas porque quer saber isso?
— Porque eu tenho uma
foto idêntica a essa comigo
— Sério? Como? — ele estava
extremamente surpreso ao saber daquilo
— É a única foto que
tenho da infância. Minha mãe me disse que era só isso que eu tinha nas mãos
quando me encontrou na adoção —
eu disse, e nesse mesmo instante as imagens daquele dia voltavam à mente.
— Então você...
Ele
não terminou a frase, porque eu disparei dizendo:
— Quem é a menina? A que
está do seu lado —
eu apontei para a fotografia
— Minha irmã mais nova.
Eu a perdi há muitos anos...
— A quem você escreveu
uma carta, certo?
— Certo. Como sabe?
— Eu a vi enquanto
estava fora. Desculpe se invadi sua privacidade ou algo assim, ao lê-la
— Tudo bem, mas aonde
quer chegar com tudo isso? Além disso, você está estranha. Nunca a vi tão tensa
desse jeito
Estava
mesmo tensa, sem saber direito como agir, embora estivéssemos tendo uma
conversa bem natural naquela hora. Ele realmente me conhecia bem.
— Você não a perdeu — Eu assegurei a ele — Sua irmã, você não a
perdeu, ela foi adotada esse tempo todo. E ela estava embaixo do mesmo teto que
você.
— Você está me dizendo
que... — agora era ele que
estava tenso sem palavras e totalmente pasmado.
— Sim, Daniel Pitt... — eu comecei, tentando me acalmar— A garota da foto, a
garota a quem você dedicou tanto tempo procurando, preocupado com ela... — respirei
fundo e após dar uma pausa, lhe revelei:
— Essa pessoa... Sou eu.
Eu sou a Mi Young. A sua Mi Young — falei com toda a força
e sentimento que consegui
Nesse
momento, ele subitamente me abraçou, daquela forma doce, que só um irmão mais
velho te dá, com todo carinho, mas de outro lado, também era um abraço de
alívio. Ele finalmente podia ficar aliviado por ter se encontrado com quem
tanto desejou durante anos
— Mi Young... — era a vez dele se
emocionar e deixar algumas (muitas)
lágrimas rolarem —
Nunca mais vou te deixar —
ele afirmou, com tanta determinação que me impressionou.
— Oppa... — eu tinha um sorriso no
rosto, ao mesmo tempo em que me emocionei (uma vez mais) com as palavras dele.
— Me perdoe, Mi Young — ele pediu, como quem
quer e precisa mesmo fazer isso
— Eu te perdoo. Pelos
seus acertos e erros e por tudo o que fez por mim. No passado e no presente. O
tempo não voltará, nem trará de volta a nossa época de criança. Mas o tempo
corre, assim como a vida, como você bem sabe melhor que eu, oppa. Então, não se
lamente, siga seus próprios conselhos e olhe para frente, porque agora temos um
futuro imenso juntos! Certo?
— Claro que sim! Me
alegra ouvir essas palavras vindas de você. —
ele estava grandemente feliz
Sorri
em resposta. Ele pegou na minha mão e disse carinhosamente:
—Já que estamos no
clima, vamos sair para tomar um sorvete? Está quente, como naquele dia.
— Sim, exatamente como
naquele dia —
concordei com um sorriso de ponta a ponta no rosto.
— E não vou a mais
nenhum lugar sem a minha Mi Young —
ele me disse com firmeza, enquanto saíamos do local, com uma mistura de
carinho, admiração e amor. E aquele único “momento entre irmãos” era o que nos
bastava para nos alegrar ainda mais, numa tarde ensolarada.
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